
Sobre o Ano Internacional das Montanhas
26.07.2002
2002 foi declarado o Ano Internacional das Montanhas pela Organização das Nações Unidas (ONU) com o objetivo de incentivar o debate e a conscientização do mundo sobre esse frágil ecossistema, assim como para estimular os países na implantação das políticas e ações de desenvolvimento sustentável propostas pela Agenda 21 em seu Capítulo 13 (Gerenciamento de Ecossistemas Frágeis: Desenvolvimento Sustentável das Montanhas). Essa Agenda, documento final da Conferência da Terra, realizada na cidade do Rio de Janeiro em 1992 (RIO 92), apresenta uma série de medidas a serem tomadas pelos países na busca de uma utilização sustentável dos recursos da Terra, visando ao seu usufruto, não só pela população atual, mas também pelas futuras gerações.
Vários países estão se preparando para o encontro RIO+10, a ser realizado esse ano na África do Sul, onde serão discutidas as realizações mundiais nos dez anos de vigência da Agenda 21 e suas perspectivas. Aqui no Brasil, mais especificamente em relação às montanhas, será realizado entre 15 e 16 de agosto, no Parque Nacional do Itatiaia (RJ/MG), o Seminário de Mobilização para os Ecossistemas de Montanha, com o objetivo de sensibilizar o país e propor medidas sustentáveis quanto ao uso desses frágeis ambientes, assim como contribuir com idéias e trabalhos para a delegação brasileira na Conferência RIO+10.
As montanhas são fontes de vários recursos naturais importantes para o homem, como água, energia e diversidade biológica. Mas, devido às suas características, são extremamente frágeis e vulneráveis à degradação ambiental, tanto natural quanto, principalmente, humana. Por isso, é extremamente necessária a conscientização da população mundial no que se refere à proteção desse ecossistema, se quisermos preservar nossa qualidade de vida. Além da utilização econômica irresponsável dos recursos montanhosos ao longo dos anos, existe um risco recente, mas não desprezível, e que diz respeito diretamente a nós, amantes da natureza: é o turismo dito ecológico, que vem crescendo muito nos últimos anos.
Todos nós devemos ter consciência de que ir para as montanhas requer um comportamento ecologicamente correto, consciente da fragilidade desse meio e da nossa responsabilidade em preservá-lo, evitando qualquer atitude, por menor que seja, que possa pôr em risco esse ambiente. O Código Brasileiro de Ética de Escalada, elaborado durante o 1º Congresso Brasileiro de Montanhismo em 1993, declarou que "todo escalador (tomo a liberdade de acrescentar e todo montanhista) tem o dever moral de transmitir uma boa atitude em relação à montanha e à prática do esporte". Esse é um documento que visa o comportamento ético em um esporte específico, a escalada. O que não impede de ser plenamente adaptável ao montanhismo em geral, no que diz respeito à ética, à moral e ao respeito ao meio-ambiente. Mas, no plano pessoal e humano, ir ao encontro da Natureza não é simplesmente visitar, admirar, usufruir e preservar uma bela paisagem. É algo muito maior, é místico: estar na Natureza é como voltar para casa depois de séculos de exílio. É perceber que somos irmãos de cada ser vivo e de cada rocha e sermos reconhecidos como tais pelo vento e pela chuva; é entregar-se completamente a essa explosão de força e beleza e, ao reaprender Suas leis, sentir que somos parte do Universo.
Pôr em prática a idéia de percorrer a Trilha John Muir em pleno Ano Internacional das Montanhas foi uma feliz coincidência. No momento em que decidi realizar o projeto no início do ano, não me lembro de ter passado pelas idéias, uma consideração que fosse sobre a decisão da ONU. Mas, na medida em que as notícias sobre esse evento iam aparecendo e a minha viagem se concretizando, pensar na possibilidade e na oportunidade de fazer o elo entre os dois foi um processo natural. Só que existia um motivo mais importante para essa ligação: como montanhista, eu tenho o dever moral de falar sobre esse evento mundial. E faço fé que a minha caminhada, simples e solitária na sua estrutura, consiga se juntar a tantas outras vozes que já estão aí, chamando a atenção para os ecossistemas de montanha e a necessidade de sua preservação. Pois quanto mais se toca num assunto, mais se ouve falar nele; conseqüentemente, mais se fala nele, o que leva mais gente a ouvir sobre ele, e...